sábado, 8 de maio de 2010

Sessão de Hemodiálise 401

Na hemodiálise, eu vejo que a maioria das pessoas dorme – ou tenta dormir, porque, além de ser difícil dormir com o corpo preso à máquina, a equipe de enfermagem deve medir a pressão de hora em hora para verificar se o paciente está bem. E dormir com o sono entrecortado não é dormir.

Os pacientes que têm fístula devem tomar cuidado para não dormir em cima do braço que está ligado à maquina. Uma vez, dormi em cima do braço da fístula e a agulha escapou da veia, causando uma terrível e dolorosa infiltração. O sangue foi empurrado para baixo da pele na velocidade com que o coração o bombeia. A dor é intensa, e se os enfermeiros não vêm socorrer você rapidamente – e eles vêm, porque a clínica inteira escuta seu berro de desespero –, parece que o braço vai estourar.

Às vezes, eu consigo dormir um pouco. Hoje, por exemplo, eu dormi – muito mal. O problema é que geralmente quando eu durmo na diálise tenho pesadelos. Muitas vezes eu acordo com trancos fortes, sobressaltado, como se a primeira imagem que surgisse quando eu começo a sonhar fosse uma porta batendo na minha cara. Para evitá-la, eu acordo com um pulo. Isso chama a atenção de enfermeiros e pacientes que estão na área do meu box. Noto que isso tem ficado cada vez mais frequente, e temo que cause infiltrações, pois não se pode ficar chacoalhando com as agulhas no braço.

Definitivamente, não existe tranquilidade num sono assim. Também, de que adiantaria ter sonhos lindos, e acordar para a realidade de uma sessão de hemodiálise?

Em determinado momento, em um de meus trancos, acordei e percebi que uma mulher com um uniforme de uma empresa de atendimento de emergência estava trazendo uma senhora idosa desacordada em uma maca. Ouvi-a dizer que a paciente estava com uma séria infecção bacteriana no pé que lhe causava diarreia – ela passaria toda a sessão revirando-se nas próprias fezes, impotente, sem poder se levantar. Vi os enfermeiros a colocaram prontamente na cadeira vizinha à minha, já que o Seu José Antônio foi transferido para outra máquina. Algum tempo depois, essa senhora, a Dona Maria Lúcia, começou a gemer, “Ai... ai... ai... ai...”. Lembrou-me muito outra idosa que também era vizinha minha quando fiz hemodiálise em 1995, antes do meu primeiro transplante, a Dona Maria José. No decorrer de toda a sessão, ela implorava “Desliga eu... desliga eu... desliga eu...”. É muito cruel ver idosos terminarem – assim como crianças iniciarem – a vida desse jeito, presos a uma máquina que salva a sua vida em troca de uma qualidade de vida tão baixa.

Um comentário:

  1. Tenho muita pena de pessoas mais velhas que dialisam...e não podem transplantar!
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